domingo, 13 de dezembro de 2009

Se conselho fosse bom...

Se conselho fosse bom, não era de graça.
É o que dá vontade de dizer quando algum chato vem dar palpite sem ser convidado. Mas... o palpite pode ser a melhor saída!
É o que diz um estudo publicado em março na revista Science. A idéia é a seguinte: se tenho de prever como vou me sentir em alguma situação (e.g., casamento), faço uma previsão afetiva (serei muito feliz). Aí mora o perigo (na previsão):
  • baseamos o futuro no presente (mas o futuro provavelmente não será como o presente)
  • pensamos nos aspectos principais (construir um lar com a pessoa amada), mas não nos secundários (retirar o cabelo que a pessoa amada esqueceu no sabonete)
  • pensamos nos aspectos iniciais (lua-de-mel) e esquecemos os posteriores (feriados na casa da sogra)
Os pesquisadores constataram que, para saber como você vai se sentir,
  • é melhor saber como se sente alguém do seu contexto (um vizinho social) que já passou pela situação do que saber sobre a própria situação
O problema é que depois também descobriram que ninguém acredita nisso. Afinal, como posso aceitar que até mesmo um estranho saiba mais sobre a MINHA vida do que eu???
Mas é verdade. Por pior que seja, pode valer a pena refletir da próxima vez que você ouvir "Eu já passei por isso, sei como é...".

Observações:
  1. Artigo original: Gilbert, D.T., Killingsworth, M. A., Eyre, R. N., Wilson, T. D. (2009). The Surprising Power of Neighborly Advice. Science, 323, 1617-1619;
  2. O grande psicólogo Daniel Gilbert, da Harvard University, primeiro autor deste estudo, também é autor de Stumbling on Happiness (a tradução poderia ser 'Tropeçando na Felicidade'). Esse livro é uma análise bem mais ampla e detalhada destes e de vários outros erros de pensamento em que tropeçamos diariamente, ajudando a entender porque não alcançamos a felicidade tão desejada. Mas, no fim do primeiro capítulo, ele já antecipa: "Eu vou concluir [o livro] falando sobre um remédio simples [seguir o conselho do vizinho social] para essas ilusões que você quase certamente não aceitará".

6 comentários:

  1. O negócio é que as pessoas que dão conselhos estão sempre pensando mais nelas mesmas e no que elas fariam. Entretanto, ao fazerem isso, costumam desconsiderar a vida do próprio cidadão a quem aconselham.

    Ou seja, meu pai dá conselhos pra mim pensando na vida que ele leva. Só que ele tem 52 anos e eu 26. Os ritmos de vida são diferentes, assim como as experiências. Agora, se ele me desse conselhos pensando em quando tinha 26, por exemplo, acho que seria mais produtivo e coerente. Estou certo, doutor?

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  2. Os conselhos de fato partem da perspectiva de quem aconselha, mas não sei se pensando em si próprio. O fato de o conselheiro já ter passado pelos tais 26 anos é um dos pontos que lhe permitiria aconselhar (ou ter o conselho ao menos ouvido).

    Num caso banal, uma pessoa que já foi reconhecer firma no cartório pode dizê-lo como esse procedimento ocorre. Quanto tempo leva, etc. E, a partir da própria experiência, dizer quanto tempo o procedimento deve demorar. Isso independente de ser você ou o conselheiro.

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  3. É verdade. Mas a questão não a de simplesmente passar um procedimento. E sim de que forma encará-lo. Se peço um conselho financeiro a alguém que está muito preocupado com dinheiro, ouvirei a perspectiva de uma pessoa que valoriza muito o capital. E, por mais que pense em mim, ela vai acabar sendo tendenciosa para o próprio lado. É o velho: "se eu fosse você...".

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  4. Rodrigo, a forma de encará-lo me parece importante também. Mas a pesquisa desconsiderou essa variável e distribui todos os participantes aleatoriamente. Isso dá alguma segurança de que as variáveis desconsideradas não afetam o resultado, pois ficam alocadas igualmente em todos os grupos.
    Ou seja: mesmo que essa seja uma variável importante, não compromete a conclusão do estudo.

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  5. Leo, como o blog é Psicologia para leigos, vou tomar a liberdade de comentar, tá? :)

    Achei teu comentário um tanto técnico demais...

    Analisando e pensando no dia-a-dia... como minha mãezinha, por exemplo, sempre me dando seus conselhos amorosos baseando-se nas suas experiências. Mas, mesmo eu não concordando certas vezes, acabam servindo de alertas para evitar que eu caminhe por caminhos que ela já tenha passado... sabedora das pedras e espinhos que eu posso encontrar ali.

    De uma certa forma, conselhos acabam aumentando a nossa biblioteca interior de experiências e vivências, algumas úteis e boas, outras nem tanto..
    Um beijo!!

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  6. Por favor, comente mesmo!
    Exatamente. Aumentam a biblioteca interior. O complicado é discernir entre eles...

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